jueves, 3 de junio de 2010

Poema em linha reta - Álvaro de Campos (Fernando Pessoa)

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.


E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.


Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...


Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,


Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?


Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?


Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

----------------------------------------------

Poema en línea recta

Nunca conocí a nadie a quien le hubiesen roto la cara.
Todos mis conocidos fueron campeones en todo.
Y yo, que fui ordinario, inmundo, vil,
un parásito descarado,
un tipo imperdonablemente sucio
al que tantas veces le faltó paciencia para bañarse;
yo que fui ridículo, absurdo,
que me llevé por delante las alfombras de la formalidad,
que fui grotesco, mezquino, sumiso y arrogante,
que recibí insultos sin abrir la boca
y que cuando la abrí fui más ridículo todavía;
yo que resulté cómico a las mucamas de hotel,
yo que sentí los guiños de los changadores,
yo que estafé, que pedí prestado y no devolví nunca,
que aparté el cuerpo cuando hubo que enfrentarse a puñetazos,
yo que sufrí la angustia de las pequeñas cosas ridículas,
me doy cuenta que no hay en este mundo otro como yo.
La gente que conozco y con quien hablo
nunca cayó en ridículo, nunca sufrió un insulto,
nunca fue sino príncipe -todos ellos príncipes- en la vida...
¡Ah, quién pudiera oír una voz humana
que confiese no un pecado sino una infamia;
que cuente no una violencia sino una cobardía!
Pero no, son todos la Maravilla si los escucho.
¿Es que no hay nadie en este ancho mundo capaz de confesar que una vez
fue vil?
¡Oh príncipes, mis hermanos!
¡Basta, estoy harto de semidioses!
¿Dónde está la gente de este mundo?
¿Así que en esta tierra sólo yo soy vil y me equivoco?
Admitirán que las mujeres no los amaron,
aceptarán que fueron traicionados -¡pero ridículos nunca!-
Y yo que fui ridículo sin haber sido traicionado,
¿cómo puedo dirigirme a mis superiores sin titubear?
Yo que fui vil, literalmente vil,
vil en el sentido mezquino e infame de la vileza.

No hay comentarios: